domingo, junho 10, 2007

A Pior Noite de São Paulo

Estávamos sentados em minha cozinha, eu e C. no banco aparafusado a parede e Marcelo do outro lado. Acho que não conseguíamos nos decidir em alguma coisa para fazer, isso andava acontecendo bastante. Se não me engano foi C. quem lançou:
- Ei, se lembram da melhor noite de São Paulo?
Eu me lembrava, dei um aceno com a cabeça. Marcelo ficou uns instantes olhando para o teto, depois soltou um “ah, lembro-me”. Nunca vou entender os momentos que ele escolhe para usar ênclises. Logo depois C. continuou:
- Por que mesmo aquela foi a melhor noite de São Paulo?
- Hum, - eu disse – acho que foi porque nós nos divertimos aquele dia, não? Eu me lembro que nos sentimos alegres falando de um futuro que nunca vai acontecer. E depois a gente se sentiu confortável dentro de carros conhecidos e de carros desconhecidos. Eu acho que foi isso.
- Mas sabe, - ele respondeu - será que isso quer dizer que nunca mais vamos ter uma noite melhor que aquela? Tudo que a gente fizer vai ser pior que aquilo com certeza?
- Pelo menos foi só de São Paulo, ainda tem um monte de cidade para a gente visitar; foi o que Marcelo disse. Acho que ele estava bêbado na hora, não me lembro muito bem.
- Além do mais, - eu disse - só porque aquela foi a melhor não quer dizer que outras não possam ser boas. Dá para as outras noites serem um tiquinho piores, mas ainda assim muito divertidas.
- É verdade! É verdade! – foi o que o C. exclamou. Ele se animou um pouco e começou a fazer uma dança com alguns de seus dedos.
Depois disso ficamos em silêncio por mais alguns momentos. C. continuava com sua dancinha e Marcelo com os olhos no teto. Não sei o que eu fazia. Devia estar prestando atenção nos dois, eu acho. Marcelo então baixou os olhos e disse:
- Nessa noite eu não tive uma briga feia com a minha ex-namorada?
- Não consigo me lembrar de muitas coisas. - disse o C., sem parar com sua dança.
- Vocês estão falando sério que não se lembram de nada? – eu disse – É, você brigou sim com sua ex-namorada. E o C. se sentiu muito mal por ter feito um papel de bobo para a dele, não se lembram de nada disso? Todos vocês passaram mal, alguns vomitaram, e terminaram a noite completamente tristes.
- Rapaz! – C. disse – É verdade, to me recordando agora. Tinha me esquecido de tudo isso.
- Espera aí. – foi o Marcelo dizendo – Quer dizer que toda essa porcaria só aconteceu com a gente? E com você, não aconteceu nada? Você não brigou com ninguém nem sentiu nada por causa da noite?
- Não briguei com ninguém, com quem eu poderia brigar? Eu não estava com ninguém, eu estava vendo desenhos animados enquanto vocês brigavam. Também não teria porque me sentir mal. Se qualquer coisa, eu me senti um pouco alegre por ver todos os casais brigando e terminando mal a noite enquanto eu estava alegre com meus desenhos.
Marcelo deu uma suspirada. A dancinha dos dedos de C. havia mudado, como se a música para a qual dançassem fosse agora mais triste. Eu dei um último gole em meu copo e com isso toda nossa bebida tinha acabado.
- Não sei se tenho mais muita vontade de lembrar da melhor noite de São Paulo, ela não me parece mais muito boa. E se realmente nunca mais tivermos nada melhor que aquilo será uma tristeza. – disse Marcelo.
- Quem sabe “Melhor” seja só um título, sabe? – disse C. – que nem o Elton John ser um Sir.
- É verdade. Ele é um Sir e a música dele continua uma porcaria. – eu disse.
Enquanto C. discutia comigo quão fabuloso Elton John era, Marcelo pegou um talher qualquer jogado na mesa e começou a bater levemente do lado de seu copo vazio. Paramos e olhamos para ele:
- Proponho então um brinde. Aqui está, para hoje! A Pior Noite de São Paulo!
- Pior noite? – eu disse – Não está tão ruim assim.
-É! – disse C. – Eu até comi hoje!
- Isso não importa! – Marcelo disse – A idéia é transformar essa na pior noite de todas. Se essa aqui for a pior quer dizer que as outras serão melhores, logo não temos muito a perder.
“É, faz senti...” foi o que C. disse. Mas na hora que estava para terminar a frase o banco onde estávamos soltou da parede e caímos no chão. Nenhum dos dois se machucou muito. Depois de nos levantarmos C. tentava reerguer o banco, achando que aquilo era de alguma forma culpa dele.
- Não se preocupe. – eu disse – Esse banco já estava velho. Há mais de 15 anos que eu sentava nele, uma hora ia quebrar. De qualquer jeito ele durou mais do que a maioria de nós. Você estava falando de um brinde?
- É! – disse C. – À pior noite de São Paulo?
- Á Pior Noite de São Paulo!

E brindamos com nossos copos vazios.

1 Comments:

Blogger (Cheetara) said...

hehe

9:57 PM  

Postar um comentário

<< Home