EDGAR
Edgar chegou do colégio mais uma vez. O que havia de raro hoje é que estava sozinho em casa. Não demorariam, mas talvez entendesse melhor destes momentos do que dos habituais: ao invés de lidar com variantes, fazer exatamente o que faz sempre, só que refletido, lento, a tensão toda montada: palco e escapatória, ambos no mesmo montado.
Jogou a mochila a um canto, tirou o tênis, depois a meia, deixou tudo na sala, mas subiu pro quarto, como faz todo dia, e lá teve a certeza rápida e plena de que precisaria desfazer tudo o que fez até ali – mochila e tênis no quarto, meia no cesto –, mas nada refez ou mudou naquele momento. O impacto raro estava justamente nisso, nesta obrigatoriedade em encenar o hábito.
De repente, as variantes incontornáveis, pois tinha dias que passava o dia todo com a roupa do colégio, tinha dias que a primeira coisa que fazia era querer trocar de roupa.
Apelou pro tempo: nem frio, nem quente. Procurou um desejo de grávida que quisesse uma coisa ou outra prontamente, mas encontrou só o espelho.
De lá, Edgar conseguiu enxergar um chortes sobre uma pilha de roupas para lavar, que pareceu escolher no lugar de ambos, Edgar e espelho; e, assim, logo estava sentado com pernas de indiozinho à frente do espelho, de chortes e ainda com a camiseta do colégio. Parecia contente com as soluções até ali, que desembocavam na seriedade que agora lhe tomava o rosto e outras partes mais legíveis. Tudo era assim nestes momentos: rápido e preciso.
Vigiou a porta, reparou cada centímetro de verdade que havia na pequenez e na rigidez com que a tramela da porta se adiantava para dentro da parede do quarto. Os seus próprios olhos tinham a cor da porta fechada quando chegou ao espelho mais uma vez, não chegariam ainda, mas ele estava prestes a não sair do quarto, a não fazer nada além do que fazia quase todas as tardes, nada podia dar errado, sabia, mas estava preparado para tocar a perna direita com a mão direita: metade dela no calor da perna e em ser descoberto, metade na indiferença azul do chortes. Com a esquerda, subiu e apertou um seio imaginário até chegar a um dos mamilos, que legitimava tudo: prazer e seio. Se olhava tão plenamente nos olhos, que o corpo preenchia de surpresa as partes que não via.
Deslizou a mão direita rumo ao centro do corpo e foi com espanto que considerou o dedo em riste um pau deveras pequeno e fino para então demarcar por fora do chortes mesmo o que era o seu próprio duro.
Mesmo com a mão cheia de pano, enfiou o dedo do meio entre as bolas, um outro dedo contornando apertando uma delas, a mão esquerda ainda num dos seios, campainha.
Abriu-se rápido, se achou no espelho e levantou. Quem seria? Os pais não tocariam. Quase tão rápido, tédio, carteiro ou vizinho.
Desceu a escada e olhou pelo olho-mágico: lá fora um anão vestido de terno preto se apoiava numa bengala para tentar fazer exatamente o que Edgar estava fazendo. Dois travestis, um de cada lado do anão, exibiam um número consideravelmente maior de cores.
Edgar sentiu a porta se abrir contra o seu corpo, que recuou com o impacto, com a surpresa pelo mistério das tramelas.
- Boa tarde. Você que é o Edgar?
- Sim, por quê? Eu tranquei a porta.
- Sabe que isso já é um problema, não é?
- O quê?
- O nome, Edgar. Você não poderia se chamar Xande?
- Eu não poderia me chamar Edméia?
- Você não entende o que está falando...
- E qual o seu nome?
- Não importa: estas são Xana e Stephany.
- Prazer...
- Onde?
O rosto delas realmente parecia triste; assustador e frio com o posterior silêncio, embora o som seco e uníssono da pergunta já indicassem isso.
- Eu gostaria de um cafezinho, disse o anão, esfregando uma das pontas do bigode farto.
- Não sei fazer
- eu o que também não sabe, Edgar?
- e é você quem vai me dizer?
- e o que você sabe, Edgar?
- que você deveria ir embora?
- que você não vai sair daqui tão cedo...
Xana foi preparar um café, mal-humorada. Stephany pegou coca-cola pra si na geladeira.
- Abaixe o chortes, ele não esperaria o café.
- Pra quê?
- Não sei o quanto alto você vai ficar. Poderia ser mais simples, igual pata de cachorro: quanto maior a pata, maior será o cão, seus pais são altos?
- Não muito.
- Espera espichar?
- Não sei, mas um primo mais velho espichou.
- Já deu pra ele?, alisando a bengala.
- Não e nem quero.
- Quanto calça?
- Quanto maior o pé, maior o pinto?
- Bingo!, o nariz até que é grande...
- É prova o bastante?
- A sua mãe é uma coroa enxuta? Vocês travas me cansam às vezes...
- Eu não
- Bingo!, e nem vai ser, meu caro.
Edgar abaixa o chortes bruscamente, a cueca indo junto
Sabia!, batendo irritado com a bengala no chão, e duvido que espiche, a sua voz também não parece que vai ser grave; desista, desista, até que é um bom momento, vira gay, trabalha na porra do escritório do seu pai, dá pro pleiba no fim de semana, engravida uma sem-sal, cria um gato, seilá, essas coisas, estamos conversados?
Xana e Stephany provavam chá com leite.
- a tramela...
- Eu tranco ao sair.
12/11/07 - LRP
by Suricate, 03h05 da manhã, tem filologia hj, às 8...
Jogou a mochila a um canto, tirou o tênis, depois a meia, deixou tudo na sala, mas subiu pro quarto, como faz todo dia, e lá teve a certeza rápida e plena de que precisaria desfazer tudo o que fez até ali – mochila e tênis no quarto, meia no cesto –, mas nada refez ou mudou naquele momento. O impacto raro estava justamente nisso, nesta obrigatoriedade em encenar o hábito.
De repente, as variantes incontornáveis, pois tinha dias que passava o dia todo com a roupa do colégio, tinha dias que a primeira coisa que fazia era querer trocar de roupa.
Apelou pro tempo: nem frio, nem quente. Procurou um desejo de grávida que quisesse uma coisa ou outra prontamente, mas encontrou só o espelho.
De lá, Edgar conseguiu enxergar um chortes sobre uma pilha de roupas para lavar, que pareceu escolher no lugar de ambos, Edgar e espelho; e, assim, logo estava sentado com pernas de indiozinho à frente do espelho, de chortes e ainda com a camiseta do colégio. Parecia contente com as soluções até ali, que desembocavam na seriedade que agora lhe tomava o rosto e outras partes mais legíveis. Tudo era assim nestes momentos: rápido e preciso.
Vigiou a porta, reparou cada centímetro de verdade que havia na pequenez e na rigidez com que a tramela da porta se adiantava para dentro da parede do quarto. Os seus próprios olhos tinham a cor da porta fechada quando chegou ao espelho mais uma vez, não chegariam ainda, mas ele estava prestes a não sair do quarto, a não fazer nada além do que fazia quase todas as tardes, nada podia dar errado, sabia, mas estava preparado para tocar a perna direita com a mão direita: metade dela no calor da perna e em ser descoberto, metade na indiferença azul do chortes. Com a esquerda, subiu e apertou um seio imaginário até chegar a um dos mamilos, que legitimava tudo: prazer e seio. Se olhava tão plenamente nos olhos, que o corpo preenchia de surpresa as partes que não via.
Deslizou a mão direita rumo ao centro do corpo e foi com espanto que considerou o dedo em riste um pau deveras pequeno e fino para então demarcar por fora do chortes mesmo o que era o seu próprio duro.
Mesmo com a mão cheia de pano, enfiou o dedo do meio entre as bolas, um outro dedo contornando apertando uma delas, a mão esquerda ainda num dos seios, campainha.
Abriu-se rápido, se achou no espelho e levantou. Quem seria? Os pais não tocariam. Quase tão rápido, tédio, carteiro ou vizinho.
Desceu a escada e olhou pelo olho-mágico: lá fora um anão vestido de terno preto se apoiava numa bengala para tentar fazer exatamente o que Edgar estava fazendo. Dois travestis, um de cada lado do anão, exibiam um número consideravelmente maior de cores.
Edgar sentiu a porta se abrir contra o seu corpo, que recuou com o impacto, com a surpresa pelo mistério das tramelas.
- Boa tarde. Você que é o Edgar?
- Sim, por quê? Eu tranquei a porta.
- Sabe que isso já é um problema, não é?
- O quê?
- O nome, Edgar. Você não poderia se chamar Xande?
- Eu não poderia me chamar Edméia?
- Você não entende o que está falando...
- E qual o seu nome?
- Não importa: estas são Xana e Stephany.
- Prazer...
- Onde?
O rosto delas realmente parecia triste; assustador e frio com o posterior silêncio, embora o som seco e uníssono da pergunta já indicassem isso.
- Eu gostaria de um cafezinho, disse o anão, esfregando uma das pontas do bigode farto.
- Não sei fazer
- eu o que também não sabe, Edgar?
- e é você quem vai me dizer?
- e o que você sabe, Edgar?
- que você deveria ir embora?
- que você não vai sair daqui tão cedo...
Xana foi preparar um café, mal-humorada. Stephany pegou coca-cola pra si na geladeira.
- Abaixe o chortes, ele não esperaria o café.
- Pra quê?
- Não sei o quanto alto você vai ficar. Poderia ser mais simples, igual pata de cachorro: quanto maior a pata, maior será o cão, seus pais são altos?
- Não muito.
- Espera espichar?
- Não sei, mas um primo mais velho espichou.
- Já deu pra ele?, alisando a bengala.
- Não e nem quero.
- Quanto calça?
- Quanto maior o pé, maior o pinto?
- Bingo!, o nariz até que é grande...
- É prova o bastante?
- A sua mãe é uma coroa enxuta? Vocês travas me cansam às vezes...
- Eu não
- Bingo!, e nem vai ser, meu caro.
Edgar abaixa o chortes bruscamente, a cueca indo junto
Sabia!, batendo irritado com a bengala no chão, e duvido que espiche, a sua voz também não parece que vai ser grave; desista, desista, até que é um bom momento, vira gay, trabalha na porra do escritório do seu pai, dá pro pleiba no fim de semana, engravida uma sem-sal, cria um gato, seilá, essas coisas, estamos conversados?
Xana e Stephany provavam chá com leite.
- a tramela...
- Eu tranco ao sair.
12/11/07 - LRP
by Suricate, 03h05 da manhã, tem filologia hj, às 8...
2 Comments:
huhu!
o correto é shorts, ou shortes, sei lá...
Reparei no CHORTEs também. Quando eu não estiver bêbado e falo do texto em sim. (juro).
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